Artigos Médicos
Julho Amarelo: mês de luta contra as hepatites virais
Estamos já com mais de um ano da pandemia de covid-19 que sacudiu o mundo e ainda parece um pouco distante de ser completamente resolvida. Alguns países têm se saído um pouco melhor a depender do modo com que os governos lidaram com ela; outros, como infelizmente o Brasil, ainda têm muito caminho a percorrer, pois negar esta tragédia coletiva posicionou-nos muito mal no ranking de resultados nessa luta contra o SARS-Cov2.
Para além da pandemia, muitas doenças continuaram seu trajeto, dentre elas as hepatites virais. Ao longo dos anos, após muitas lutas, essas condições ainda estão presentes em nossa população, sendo portanto necessário que as pessoas tenham informação para fazerem a sua parte, além de cobrarem políticas públicas com vistas ao enfrentamento das hepatites virais.
O dia 28 de julho foi estabelecido como o Dia Nacional de Combate às Hepatites Virais e estamos no “Julho Amarelo”, mês em que ocorrem campanhas e ações de conscientização para informar e sensibilizar a população a respeito das hepatites crônicas B e C, cujo impacto na saúde ainda é importante.
Primeiramente, ressalto que ambas podem ocorrer sem sintomas, o que significa que uma pessoa pode estar contaminada pelo vírus da hepatite B ou da hepatite C e não se sentir doente, pela ausência de sintomas. Esqueçam os sinais clássicos que todos referem, como icterícia (olhos amarelados), febre, vômitos e fraqueza. Tudo isso é comum na hepatite A, doença aguda autolimitada, que chega e se vai do organismo sem sequelas.
As hepatites B e C podem tornar-se crônicas, provocar cirrose e até mesmo o câncer de fígado. Por isto, as pessoas precisam ser testadas, independentemente de estarem com sintomas. É certo que há pessoas de maior risco, mas é fundamental que se realize os testes diagnósticos. Estes compreendem: HBsAg (para detectar hepatite B) e anti-HCV (para detectar hepatite C), que podem ser solicitados por qualquer médico, de qualquer especialidade e tanto no serviço público quanto na medicina privada.
É importante ressaltar que estes testes podem fazer uma enorme diferença na saúde populacional, pois fazem parte das estratégias de identificação das hepatites crônicas, em sua maioria totalmente assintomáticas, o que torna muito difícil o diagnóstico. Portanto, quem nunca fez estes testes deve pedir ao médico para solicitá-los, mesmo que não tenha sintomas.
Se o HBsAg ou o Anti-HCV for reagente, a pessoa deve procurar o médico para que complemente o diagnóstico com os exames subsequentes. Este pode ser o hepatologista, o gastroenterologista que tenha atuação na hepatologia e o infectologista. A partir dos exames realizados em seguida, deve ser instituído o tratamento. Já existem diretrizes internacionais e também um PCDT (Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas) nacional, devendo as condutas serem individualizadas.
Na Paraíba, os centros de referência em hepatites virais são o Complexo Hospitalar de Doenças Infecto-Contagiosas Dr. Clementino Fraga e o Hospital Universitário Lauro Wanderley. O SUS fornece gratuitamente as medicações atuais para ambas.
A grande mudança que ocorreu nos anos recentes foi a incorporação dos novos antivirais para o tratamento da hepatite C, que, diferentemente dos anteriores, propiciam uma alta taxa de cura (quase 100%) num curto espaço de tempo (8 a 12 semanas) e com efeitos colaterais mínimos ou mesmo sem eles.
A adoção de medidas preventivas incluem o não compartilhamento de instrumentos perfurocortantes (agulhas, seringas, lâminas de barbear, alicates de unha); o uso de instrumentos descartáveis; a adoção de práticas seguras de sexo (uso de preservativos/camisinha), dentre outras. Estas, quando associadas à testagem e a serviços de qualidade que propiciem um caminho para os pacientes acometidos das hepatites virais B e C, podem ser o caminho da erradicação desses vírus.
A meta da Organização Mundial de Saúde (OMS) é tratar 80% das pessoas com hepatite C até 2030. Oxalá isso se realize, mas sabemos todos que uma meta só pode ser atingida quando há um esforço conjunto população e governo. As pessoas só podem realizar medidas individuais, de pouco impacto, e só os governos podem instituir políticas públicas que mudem o cenário atual, ainda distante de uma erradicação das hepatites virais.
É, portanto, papel dos cidadãos e cidadãs informar e informar-se, com vistas a saber qual caminho precisam cobrar de quem comanda a saúde. Sem isso não há construção do nosso bem maior comum: a saúde coletiva.
Maria de Fátima Duques
CRM-PB: 2638
Especialidade: Gastroenterologista