Artigos Médicos

As lacunas na formação médica (I)

Publicada em 22/02/2013 às 17h

Nos últimos anos, a qualidade da atenção médica no país tem sido muito questionada, bem como a formação dos profissionais. A medicina sequer foi regulamentada no Brasil, que tem 197 escolas médicas, nem sempre habilitadas a proporcionar a capacitação adequada, por deficiências estruturais ou até ausência de hospitais-escola (1). Entretanto, não são aplicadas medidas de punição rigorosas às que são avaliadas até como de baixíssima eficiência, gerando uma triste estatística: 54,5% dos recém-formados seriam inaptos para o exercício da profissão (2). A isso junta-se a dificuldade de acesso à Residência Médica, poucas e mais concentradas em grandes cidades; o tempo de formação é longo, pois para formar um especialista o tempo mínimo é de cinco anos, após a graduação.

Uma vez no mercado de trabalho, o jovem médico (e o velho também) é subordinado a uma relação triangular, médico-plano de saúde-paciente, onde este último paga ao do meio, que é quem paga ao primeiro, determinando quanto este vai receber pelo seu trabalho. Com as atuais gigantescas estruturas administrativas dos planos/seguros de saúde, o que sobra para o médico, principalmente o clínico, é desestimulador, sendo a consulta - o coração da medicina - o procedimento mais desvalorizado. A mídia estimula, o paciente exige e o médico mal remunerado escuda-se em exames cada vez mais complexos, muitas vezes sem um olhar clínico, no qual de resto nem o paciente confia mais, se não houver um resultado de exame registrado.

As relações de poder se modificaram e o médico é também vítima dessa nova conjuntura nas práticas de saúde, como bem demonstra Miguel Srougi (2). Acredito até que, mesmo com conotação e contexto diferentes do que escreveu Bernard Shaw em O Dilema do Médico, em 1906, sua assertiva é cabível e atual: \"Não é culpa de nossos doutores que o serviço médico para a comunidade, tal como é prestado, constitua-se em monstruoso absurdo\".

Apesar de toda a tecnologia, ainda não se criou substituto para o humano. Portanto, é necessário tentar resgatar os profissionais médicos no sentido de valorizar o seu trabalho, começando por exigir uma boa formação. Sem ela, mesmo com a melhor tecnologia à nossa mão, não haverá nunca uma boa medicina e o prejuízo, sem dúvida, será de todos.

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(1) Jornal do Conselho Federal de Medicina. (2) Folha de São Paulo:
http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/1210615-tendenciasdebates-medicos-inaptos-algozes-ou-vitimas.shtml

 

 

Maria de Fátima Duques

Maria de Fátima Duques

CRM-PB: 2638

Especialidade: Gastroenterologista

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