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Alzheimer: risco diminuído com medicamento para diabetes e obesidade
Os análogos de GLP- 1 - como semaglutide, liraglutide, dulaglutide e tirzepatide - estão sendo objeto de inúmeros estudos, tanto no homem como em animais de laboratório.
Utilizados há algumas décadas no tratamento do diabetes tipo 2, mostraram efeitos importantes na perda de peso e começaram a ser prescritos mais recentemente para tratamento da obesidade. Muitos estudos apontam, ainda, para efeitos cardioprotetores, nefroprotetores e até mesmo em situações neuropsiquiátricas no sentido de reduzir comportamentos viciantes relacionados ao álcool e ao tabagismo, além de, mais recentemente, ter sido estudado para redução de crises asmáticas. Pesquisas em animais já haviam mostrado um possível efeito neuroprotetor da semaglutide e pesquisas em seres humanos começaram a ficar disponíveis mais recentemente. Há poucas semanas, um estudo observacional sugeriu que esse hormônio teria um efeito protetor contra a doença de Alzheimer superior ao observado com outros antidiabéticos. Dessa forma, poderia haver uma proteção contra a demência.
Esse estudo, realizado em um registro de mais de 1 milhão de pacientes com alto risco de doença de Alzheimer, entre 2017 e 2021 nos Estados Unidos, acaba de ser publicado na revista Alzheimer's & Dementia. Nele, procurou-se comparar o efeito da semaglutide com o de outros antidiabéticos quanto ao risco de progressão da doença de Alzheimer.
Portadores de Diabetes tipo 2 e sem diagnóstico prévio de doença de Alzheimer ou tratamento antidiabético participaram do estudo e foram acompanhados durante 3 anos. Foram distribuídos em diversos grupos da seguinte forma: semaglutide (17.104 pacientes), insulina (708.989), metformina (550.105) (os dois maiores grupos de comparação) e diferentes antidiabéticos como iDPP- 4, iSGLT- 2, sulfonilureias e outros tipos de aGLP-1. Com idade média de 58 anos, mais de 70% eram portadores de hipertensão arterial ou dislipidemia e em torno de 39% possuíam outras doenças cardiovasculares, todas reconhecidas como fatores de risco para demência.
Ao final da pesquisa, foi constatado que os pacientes que usaram semaglutide tiveram um risco significativamente menor de serem diagnosticados com Alzheimer quando comparados com aqueles que tomaram outros antidiabéticos. Percentualmente, o risco foi reduzido em cerca de 40%, em comparação com outros aGLP-1 ou iSGLT-2; em 60% a 70% em comparação com metformina e insulina, sendo os resultados semelhantes nos subgrupos separados por sexo, idade ou presença/ausência de obesidade. Os possíveis mecanismos atribuídos à semaglutide parecem estar ligados à diminuição das placas amilóides e do “emaranhado” da proteína tau nas células do sistema nervoso, aos efeitos anti-inflamatórios e à redução do estresse oxidativo através da ativação dos receptores GLP-1 no cérebro. É sugerida, ainda, uma melhoria do metabolismo cerebral, promovendo uma espécie de autofagia, ou seja, gestão de resíduos celulares, além do aumento da absorção de glicose no cérebro.
Por fim, existem em andamento dois ensaios clínicos denominados EVOKE e EVOKE Plus que buscam, por um lado, avaliar o efeito do semaglutide em pacientes não diabéticos com doença de Alzheimer incipiente e, por outro, explorar especificamente seu efeito na inflamação cerebral. Assim, estamos dando mais um passo para entender a fisiopatológico da doença de Alzheimer e a possibilidade de avançarmos no seu tratamento.
João Modesto Filho
CRM-PB: 973 / RQE 1026
Especialidade: Endocrinologista