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Convidados afirmam que paciente terminal deve ter morte digna

Publicada em 24/11/2007 às 15h46

Especialistas em diferentes áreas, exposições com enfoques distintos, mas, no final, a mesma opinião: o paciente terminal deve ter direito a uma morte digna e sem sofrimento. Foi a essa conclusão que levaram a palestra e as duas mesas-redondas realizadas na manhã deste sábado (24) no primeiro módulo do Seminário de Humanização dos Procedimentos Médicos nas Cooperativas de Saúde, que teve como tema “Humanização na Condução dos Pacientes Terminais.

Promovido pela Unimed JP, o evento foi aberto ontem à noite e encerrado um pouco depois das 14 horas de hoje, no auditório do Conselho Regional de Medicina da Paraíba (CRM-PB), no Centro da Capital. Ele teve como público-alvo profissionais que, independentemente de serem da saúde ou não, trabalhem com pacientes terminais.

Nos dois dias, os convidados discutiram como conduzir o tratamento de uma pessoa que já não tem chance de cura. Cerca de 200 pessoas se reuniram para discutir o assunto que, como afirmou o presidente da Unimed JP, Aucélio Melo de Gusmão, “não é fácil, não é doce, não é suave e envolve muitos conflitos”.

E foi Aucélio Gusmão quem abriu a programação deste sábado. Por volta das 9 horas, ele ministrou a palestra “Atitude ética permanente”. Em sua exposição, o presidente da Unimed JP apresentou conceitos relativos ao tema de sua apresentação e citou uma tríade que, jamais, deve ser deixada de lado quando se trata de lidar com o próximo: integridade, probidade e justiça.

Aucélio Gusmão comentou que, hoje em dia, há quem divida a ética em circunstancial, relativa, paliativa, mas alertou: “meia ética” não existe. Ele deixou várias reflexões para o público, três delas especificamente para os médicos: “A prática da medicina defensiva resiste à ética? Indicações desnecessárias de procedimentos contribuem para o bem-estar e recuperação do paciente? Procedimentos invasivos que praticamente nada acrescentam devem ser feitos?” Com a palavra, os médicos.

NECESSIDADES ESSENCIAIS

Depois da palestra de Aucélio Gusmão foi realizada a mesa-redonda “Necessidades essenciais dos pacientes terminais”. Os palestrantes e debatedores foram os médicos João Modesto Filho, endocrinologista e diretor Financeiro da Unimed JP; o anestesiologista Francisco Carlos Diniz; e o gastroenterologista José Eymard Filho.

João Modesto apresentou o tema “Solidariedade e atenção”. Ele alertou que a ciência, a tecnologia e a informação mudam os valores da vida e que, quando estes setores avançam, parece que o homem fica esquecido. Para o médico, este “esquecimento” acaba repercutindo nos cuidados médicos com o paciente terminal.

Isso ocorre porque, hoje em dia, se valorizam os equipamentos, as máquinas, e tenta-se manter viva a qualquer custo nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), mesmo que isto implique em muito sofrimento, uma pessoa com quadro irreversível. Como resultado, ela acaba morrendo no hospital, longe do carinho da família. João Modesto ressaltou que antes, a medicina era conceituada como “a arte de curar”, mas este conceito deve ser atualizado para “a arte de ajudar o paciente a viver bem e morrer com dignidade”.

O segundo debatedor da mesa-redonda foi o anestesiologista Francisco Carlos Diniz, que apresentou o tema “Fator dor e qualidade de vida”. Ele mostrou a importância de levar alívio aos pacientes terminais, chamando a atenção para as repercussões biológicas, sociais e psicológicas que a dor ocasiona. Francisco Diniz fez uma crítica a colegas. De acordo com ele, alguns médicos ainda relegam a prevenção da dor a um segundo plano, o que para o palestrante é um equívoco. “Não existe ‘se necessário” no caso da dor. Ela deve ser prevenida sempre”, afirmou.

Para finalizar as apresentações desta mesa-redonda, o gastroenterologista José Eymard Filho abordou o tema “Suporte nutricional”. Ele destacou as diferenças entre alimentação e nutrição, abordou o momento certo em que deve haver intervenção médica nutricional e discorreu sobre as vias de administração que devem ser adotadas, entre outros pontos. Sobre o bem-estar geral dos pacientes terminais, ele enfatizou que “muitas vezes, benefício é não fazer ou, pelo menos, não fazer aquilo que prolonga o sofrimento”.

Depois das apresentações dos três palestrantes, foi aberto um espaço para o debate. Em seguida, os participantes seguiram para um coffee-break.

IRREVERSIBILIDADE

A última mesa-redonda do seminário parecia ser a mais polêmica, mas os convidados abordaram o assunto de forma leve e – até certo ponto – com bom humor. O tema “Irreversibilidade patológica, comportamento terapêutico e visão moral das condutas” contou com a participação do presidente do Tribunal de Justiça da Paraíba, Antônio de Pádua Montenegro; do arcebispo do Estado, Dom Aldo Pagotto; do representante do Conselho Federal de Medicina (CFM), Genário Alves Barbosa; do procurador de Justiça; José Raimundo de Lima; e do pastor da Primeira Igreja Batista, Estevam Fernandes.

O presidente do TJ, Antônio de Pádua, norteou a sua opinião com base em uma experiência pessoal: a morte do pai, que descobriu ser portador de uma doença no dia 4 de agosto de 2002 e morreu no dia 22 de julho deste ano, quase cinco anos depois de ter sido acometido pela enfermidade. “Durante todo este tempo, nossa principal preocupação foi cuidar para que ele vivesse o menos mal possível, com pessoas que cuidassem dele, perto do carinho da família”, afirmou. Antônio de Pádua disse que recusou que o pai fosse levado para uma Unidade de Terapia Intensiva. “Eu já havia ficado internado em uma UTI e não queria que o meu pai passasse por isso. Queria que ele ficasse com a nossa família”, disse.

Já Dom Aldo Pagotto, entre outros pontos, destacou o conflito que a humanidade vive com relação ao valor da vida humana e o valor do êxito final da existência. Em meio a tantas dúvidas e questionamentos, ele disse que um ponto não pode ser perdido de foco. “Devemos morrer com dignidade e não por desprezo, abandono ou outras questões inaceitáveis. Além de cuidados médicos, o que um paciente terminal precisa é de amor”, disse.

Genário Barbosa, representante do CFM, começou a apresentação com questionamentos. “Até que ponto a tecnologia vai permitir que vivamos mais? Para que prolongar a vida se a irreversibilidade patológica é conhecida?”, perguntou. De acordo com ele, a questão da morte continua muito delicada não apenas para o médico, mas para toda a sociedade. Durante a apresentação, Genário Barbosa apresentou entendimentos do CFM no caso dos pacientes terminais e disse que a melhor morte é aquela que “o paciente quer e como a família deseja”.

O procurador de Justiça José Raimundo de Lima disse que o seminário promovido pela Unimed JP foi, talvez, um momento histórico, diante da importância da discussão do assunto. Para ele, a morte deve ser encarada com naturalidade, mas destacou que a sociedade não está preparada para isso. “A transitoriedade do corpo é normal e deve ser trabalhada. Tudo passa. O importante é que passe com qualidade de vida e dignidade”, afirmou.

Já o pastor Estevam Fernandes destacou que a vida humana é cheia de complexidades. “A nossa existência inclui valores, crenças e outras coisas que a gente nem pode dimensionar”, comentou. Para tanto, é preciso conduzir com muita sensibilidade a assistência a um paciente terminal. Muitas vezes, a atenção, o afeto e o carinho surtem muito mais efeito do que os medicamentos. “Como está muito na moda se falar em reengenharia da vida, sugiro que a gente passe a discutir a reengenharia da morte, no bom sentido. Não para apressá-la, mas para melhor conduzi-la para que ocorra de forma mais digna”, declarou.

Ele defende o que chama de “medicina interativa”, que inclui a colaboração de outros profissionais, como os religiosos, na assistência aos pacientes terminais. Muitas vezes, como ele lembrou, uma palavra de carinho pode operar verdadeiros milagres. “A força das emoções é muito grande”, destacou Estevam Fernandes.

ENCERRAMENTO

Durante os debates da segunda mesa-redonda, o presidente da Unimed JP, Aucélio Gusmão, fez uma intervenção, onde analisou o andamento dos trabalhos. “O que verifiquei nestes dois dias de discussões, e não poderia deixar de dizer, é que, o nosso País, apesar das dificuldades, tem futuro, graças aos homens de bem que não se furtam de participar dos debates com suas inteligências”, disse.

Após a participação da platéia nas discussões, Aucélio Gusmão retomou a palavra para encerrar o seminário. Ele agradeceu a participação dos convidados e do público. “A Unimed JP se sente gratificada com a presença de todos e, ao mesmo tempo, isso cria a responsabilidade para que outros debates amplos, com visão eclética, sejam promovidos”, afirmou.